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  • Foto do escritorCadu Lemos

A cultura tribal e o amor como estratégia


Mais um dia de trabalho chega ao fim. Reunidos em volta da fogueira, símbolo milenar de acolhimento, homens e mulheres decidem os rumos da tribo. Embora aparentemente primitivo, o evento tem sua organização: à medida que falam, os participantes vão passando adiante um bastão, instrumento do poder — nesse caso, o poder da palavra. Quem detém o bastão sabe que, naquele momento, será ouvido.

Todos esperam com paciência e humildade, pois estão certos de que sua hora de opinar chegará. Se a pessoa que recebe o bastão percebe que o que ela tem a falar já foi dito, simplesmente o passa adiante, sem necessidade de exibir seu conhecimento. Seu ego está em paz e ela sabe que será valorizada mesmo se ficar em silêncio.

Aquela comunidade não se reúne apenas para tomar decisões, mas também para marcar e celebrar a passagem do tempo. No solstício de inverno, dia em que o sol está mais afastado de um dos hemisférios e se inicia o ano agrícola, eles fazem oferendas aos deuses e cumprem rituais milenares, na esperança de que a terra lhes traga fartura e saúde.

As quatro estações do ano, com suas diferentes temperaturas, sabores, cores e aromas, são festejadas e respeitadas. Da mesma maneira, as etapas inexoráveis da vida humana, como a puberdade e a reprodução, são recebidas com alegria por todo o grupo.

A comunidade, a tribo, o clã, o grupamento humano — seja qual for o nome que queiramos dar a esse início de civilização — reconhece dois aspectos essenciais da vida sobre a Terra: de um lado, a necessidade da união para que todos progridam e, de outro, a passagem do tempo, com as inevitáveis mudanças por ela geradas.

Ao longo dos milênios, à medida que a população humana se expandia, as aldeias se transformavam em povoados, os povoados em cidades, e as cidades em metrópoles, a consciência daqueles dois aspectos acabou se diluindo. Ou melhor: continuamos tendo uma vaga idéia da necessidade de cooperação e da inevitabilidade das mudanças, mas a tribo, a comunidade, não está mais presente para nos apoiar diante desses dois fatos e dar sentido a eles.

O ser humano, no entanto, animal gregário que é, tem absoluta necessidade de pertencimento, de sentir-se parte de um grupo, sendo protegido e apoiado por ele. Assim, à medida que o século XXI se aproximava, percebemos um curioso fenômeno: as culturas empresariais passaram a preencher esse espaço, deixado vazio pela perda dos laços comunitários.

Hoje, é, ou deveria ser, papel das empresas estimular o espírito de corpo entre seus colaboradores, criando um ambiente de trabalho em que todos cooperem em prol de uma causa comum. Isso é benéfico não só para os indivíduos que lá trabalham, mas para a sociedade como um todo e, obviamente, para a própria empresa, que assim vê sua produtividade aumentar, sua imagem na comunidade melhorar e a qualidade de seus processos crescer.

Cooperação e mudança

Assim como o líder tribal respeitava a palavra dos aldeões em volta da fogueira, é dever do líder na organização, respeitar a opinião de todos em volta da mesa. Da mesma maneira, é seu dever reconhecer e celebrar as mudanças que a passagem do tempo traz.

Hoje em dia, aliás, fala-se muito em mudanças no ambiente corporativo, especialmente agora em que atravessamos uma crise sem proporções na humanidade. Mudanças no mercado, na tecnologia, no perfil do profissional, nas regras do jogo. Parece até que essa história de mudança é uma coisa nova. Talvez, de fato, o ritmo das alterações tenha se acelerado, mas não podemos nos esquecer que o filósofo grego Heráclito, 450 anos antes de Cristo, já dizia que a única constante na vida do homem é a mudança.


“Tudo flui, nada persiste, nem permanece o mesmo.”
Heráclito


Ao mesmo tempo, acompanhando essa mudança de postura das empresas diante da sociedade e da Covid 19, os profissionais também começaram a repensar seu papel dentro das organizações.


[...] poder é faça ou caia fora; autoridade é a habilidade de capturar a vontade das pessoas para fazerem seu melhor [...] Gandhi não tinha poder, mas tinha muita autoridade. Serviu e se sacrificou por uma causa. Quando você é o líder e se sacrifica pelas pessoas, você consegue autoridade.”

Amor no ambiente de trabalho

Há alguns anos, tive o prazer de redigir a abertura, para a edição brasileira, de uma interessantíssima obra — O amor é a melhor estratégia: uma nova visão do sucesso e da realização profissional. Seu autor, o norte-americano Tim Sanders, foi vice-presidente do Yahoo! e responsável pelo núcleo de criação conceitual do portal.

Antes de começar a escrever, li o original e conversei com Sanders pelo telefone. Em especial, queria saber como ele definia a questão do amor no ambiente de trabalho. Sua resposta foi surpreendente e esclarecedora.

O fato é que, ingenuamente, acreditamos que o amor é o sentimento que deve prevalecer nos ambientes de trabalho. E mais: cremos que ele vai nascer de maneira natural e intuitiva, por isso nem nos preocupamos com a questão. Na prática, porém, as boas intenções vão por água abaixo quando temos de trabalhar ao lado de alguém com quem não nos afinamos — quando ‘o santo não bate’.

Daí ficamos céticos, descrentes, e passamos a rejeitar o ambiente de trabalho, esse lugar em que temos de conviver com quem não amamos. Tim Sanders me explicou, no entanto, que quando ele diz que o amor é a melhor estratégia, não está se referindo ao sentimento do amor, e sim à atitude do amor, ao agir com amor. Eu não preciso estar amando com sentimento o sujeito da mesa ao lado, aquele com quem eu não me afino. Mas posso perfeitamente agir com amor em relação a essa pessoa.

Na filosofia de Sanders, agir com amor envolve três pontos: compartilhar conhecimentos, usar seu networking de maneira positiva e ter compaixão pelo próximo. Assim, devemos aprender o máximo que pudermos — especialmente por meio da leitura, frisa ele — e depois dividir esse conhecimento, de maneira que ele se propague e multiplique. Em segundo lugar, devemos usar nossa rede de relacionamentos com sabedoria, aproximando pessoas que possam se beneficiar disso, sem esperar nada em troca, pois mais cedo ou mais tarde seremos recompensados. Por último, ensina Sanders, devemos tratar nosso colega de trabalho com compaixão, aceitando suas limitações de ser humano.

É interessante observar que tais considerações não partem de um religioso, artista ou intelectual, mas do vice-presidente de uma das maiores empresas de Internet do mundo. Isso sinaliza uma mudança de visão no mundo corporativo, que aos poucos se torna mais consciente de seu papel agregador, humanizador.

Obviamente, essa mentalidade não está em todas as empresas, mas é estimulante saber que algumas das grandes já a encamparam.

Mas ainda há muito a fazer.




Nossa versão para o Kokopelli. Ele não é uma figura nova, na verdade, este tocador de flauta corcunda existe há séculos e sua lenda vive até hoje. Aqueles que o conhecem, sabem que ele significa a fertilidade. Ele também representa esperanças, sonhos, culturas e amor e muitos nativos americanos honram seus símbolos.


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