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Foto do escritorCadu Lemos

#7/A Não Dualidade, ou você não é quem você pensa que é. Parte 1

Atualizado: 10 de ago.



Nesta primeira edição de 2023, que chega com um atraso grande por conta das atribulações de fim de ano, a ideia era escrever sobre meditação de uma forma geral, mostrando os caminhos e as diversas abordagens, modalidades e filosofias por trás desta prática milenar que tanto me ajuda há mais de 30 anos.

Mas não vai ser esse o tema. Ou pelo menos em parte.

Por conta de um 'despertar' de alguns anos atrás que foi validado após algumas experiências recentes, quero dedicar esta edição a algo que me impactou e que, pode trazer valor para a sua vida e sua forma de enxergar o mundo.

Mas vamos por partes.

Primeiramente, reflita sobre essas perguntas:

1.Quem sou eu?

Você é o pai ou a mãe? Você é o executivo, a secretária, o enfermeiro, a aposentada ou a gerente ou tantas outras atividades que parecem nos definir? Você é a pessoa que fica frustrada quando está preso no trânsito a caminho de uma reunião importante? Ou você é uma combinação de todas essas coisas e, voluntária ou involuntariamente, muda seu papel para se adequar à sua situação?


Todas essas são respostas válidas para uma pergunta como 'Quem sou eu?' e se você chegou à conclusão de que é uma combinação dos diferentes papéis que assume, há apenas mais uma pergunta a ser feita:

2.Quem ou o que, tem a capacidade de analisar esses diferentes papéis e perceber como você se comporta de maneira diferente dependendo das circunstâncias?

Além de seus padrões de comportamento diários e habituais, é igualmente fácil ver como o “eu” muda com a idade.

Quando você olha várias fotos de sua vida, pode ver mudanças drásticas em seu corpo físico.

Ao analisar os pensamentos que passam pela sua cabeça, você pode se lembrar de como eles foram diferentes em diferentes fases da sua vida. Essa realidade de mudança, no entanto, não nos impede de pensar em nós mesmos como sendo a mesma pessoa por toda a vida.

Aliás, esse 'pensar' na realidade pode ser o ponto de partida para todos os nosso problemas, já que temos esse hábito constante de sentirmos que sempre está algo faltando por fazer, por conquistar, por resolver e tudo isso parte de uma cacofonia mental contínua de pensamentos, que achamos natural, afinal, eles vem daquele lugar atrás dos nossos olhos e entre nossas orelhas, que chamamos de 'eu'.

A 'não dualidade' pode nos ajudar a lidar com isso tudo.

Observação: Siga a leitura se de fato, você tem interesse no tema e já busca resposta a essas perguntas há algum tempo.

O que é a não dualidade:

A não dualidade, também chamada de não dualismo, abrange dois níveis simultâneos de realidade: o relativo e o absoluto. A realidade relativa é nossa experiência sensorial de nós mesmos e do mundo como entidades e processos distintos: eu, você, aquela bicicleta, o oceano, o som de um cachorro latindo, os pássaros cantando, o ônibus freando, etc.

A realidade absoluta é o fundamento subjacente de todas essas entidades perceptivamente discretas e é invisível aos nossos sentidos. Por exemplo: as moléculas e átomos e quetais que existem principalmente como espaço vazio. Na realidade absoluta não há distinções.

Não dualidade não significa unidade. Em sânscrito é chamado advaita, que significa “não dois”. Os dois níveis de realidade são inseparáveis, mas não se reduzem a um.

Eles existem simultaneamente, o que pode ser difícil de compreender em nossas mentes lineares. O despertar envolve a consciência não dual, na qual estamos conscientes das distinções e da unidade simultaneamente.

Por exemplo, você apreende e compreende as diferenças entre eu e você enquanto também experimenta a semelhança que nos une. A partir dessa consciência, a compaixão por nós mesmos e pelos outros brota naturalmente.

A não-dualidade é o reconhecimento de que, em conjunto com a multiplicidade e diversidade da experiência, existe uma realidade única, infinita e indivisível, cuja natureza é pura consciência, uma abrangente percepção do 'todo', da qual todos os objetos e eus derivam sua existência aparentemente independente.

O reconhecimento dessa realidade não é apenas a fonte de felicidade duradoura para todas as pessoas; é o fundamento da paz entre indivíduos, comunidades e nações, e deve ser a base para qualquer relação sustentável com o meio ambiente, como afirmou um dos maiores nomes nesse tema, o autor e filósofo britânico Rupert Spira.

selfinquirymeditations.com

O problema Devido à nossa cultura, educação e formação, a maioria das pessoas entra na idade adulta com um conjunto de respostas previsíveis para a pergunta "Quem sou eu?"

Pensamos:

  • Eu sou meu corpo

  • Eu sou meus pensamentos

  • Eu estou separado dos outros

  • Eu estou separado da força criativa que me fez

Para muitas pessoas, essas crenças estão tão arraigadas que parecem fatos. A pergunta, "quem sou eu?" parece dispensar qualquer tipo de resposta, afinal, não é óbvio??

O problema com essas respostas é que elas não são satisfatórias. Enquanto eu acreditar que eu sou meu corpo, vou passar minha vida toda preocupado com o que vai acontecer comigo quando meu corpo não funcionar mais.

Enquanto eu acreditar que sou meus pensamentos, vou me identificar com o conteúdo desses pensamentos, muitas vezes (na maioria eu diria, considerando o mundo pós internet, bolhas, polaridade, etc) um conteúdo bélico, contraditório e contraproducente.

Enquanto eu acreditar que estou separado das outras pessoas, tudo bem em estar em conflito com elas. Se acredito que estou separado da força criativa que me criou, sinto-me como uma marionete ao capricho de algum guardião benevolente ou maligno e a ele peço, agradeço, temo ou fujo.

Esses pensamentos e crenças não me ajudam a formar relacionamentos saudáveis, resolver conflitos ou alcançar meus objetivos. Na verdade, eles me mantêm preso e limitado. A filosofia da não-dualidade me ajuda a chegar a uma resposta mais satisfatória para a pergunta: Quem sou eu?

Para entender melhor, as perguntas que eu deveria estar me fazendo para chegar ao conhecimento de quem sou, seriam assim:

  • Se eu sou meu corpo, qual é o limite entre meu corpo e tudo o mais? São minhas terminações nervosas? Minha pele? Qual é o limite da minha pele? Meu cérebro? Meu coração? Meu cabelo? E o cabelo que cai da minha cabeça? E o ar que inspiro e expiro? E as minhas células que estão constantemente se regenerando?


  • Se eu sou meus pensamentos, como posso testemunhar meus pensamentos indo e vindo, mas permaneço firme no mesmo lugar ou ação? E os momentos em que não tenho pensamentos - deixo de existir?

Aliás, pense no que existe, no que fica, quando sua mente não está procurando nada para fazer ou resolver. Pare alguns minutos, feche os olhos e imagine isso.

  • Se estou inerentemente separado das outras pessoas e do mundo, como é que estou em constante interação e troca com tudo e todos ao meu redor? Como é que não consigo me separar do meu ambiente e existir no vácuo?


  • Se estou inerentemente separado da força criativa que me criou, onde essa força criativa existe?

Feche os olhos de novo e reflita se essa força criativa e também nós, não precisaríamos coexistir em um espaço maior que contém nós dois nele, deixando-nos ligados, conectados de forma única não separada?

Ao contemplar essas questões, chegamos a uma resposta mais funcional para a pergunta: "Quem sou eu?" Poderíamos inclusive acrescentar: "O que sou eu?" e, principalmente, "Aonde estou eu?"

A não dualidade nos ajuda a ver que fazemos parte de um todo indistinguível e que não podemos nos separar do mundo, de outras pessoas ou de nosso criador ou força criadora. Não somos em nossa essência, nossa mente ou corpo; Somos a presença observadora, a testemunha que percebe e experimenta nossa mente e corpo e que experimenta tudo o mais que existe.

Esta nova resposta é muito mais satisfatória. Isso significa que não precisamos nos preocupar com a possibilidade de um dia desaparecer completamente, porque sempre existimos e aqui estivemos.

Significa que não precisamos nos sentir excluídos, ignorados ou desconsiderados. Significa que nunca estamos realmente sozinhos, mesmo quando parece.


Significa que não compartilhamos necessariamente os limites ou os destinos do nosso corpo. Isso significa que, em última análise, tudo é como deveria ser, porque nossa história não é a história de uma pessoa individual vivendo neste espaço e tempo; nossa história é a história do universo, da própria existência, da qual nosso corpo é apenas uma pequena parte.

Quando esta resposta for experimentada com clareza, a vida se torna mais tranquila.

Indo mais fundo

A contemplação da pergunta "Quem sou eu?" e a clareza ou insight que podem vir ou não imediatamente, é um tema que dificilmente pode ser destrinchado em apenas um artigo. Requer dedicação (mas não aquela que você provavelmente está pensando, de meditar horas sem fim, sentado de pernas cruzadas de olhos fechados ou olhando para uma parede branca) mas aquela da pessoa realmente interessada na resposta, coisa que provavelmente já a incomodava há tempos...

Para muitas pessoas, é preciso uma vida inteira de contemplação para entender que todas as coisas são interconectadas e que toda separação é um mito.

Uma das perguntas mais recorrentes está ligada à mente e aos pensamentos: "Se não estou separado dos outros, como é que não conheço - ou leio ;) os pensamentos dos outros?"

Nossa existência não tem limites, mas nossa mente tem.

Ativar um estado de consciência desperta (algo como a percepção do todo, como observador e observado) é romper os limites da mente.

O autor e pesquisador Loch Kelly, definiu este estado:

"A consciência desperta não está na maioria dos nossos mapas psicológicos ocidentais, mas é reconhecida em algumas tradições orientais (faça uma pesquisa sobre Advaita Vedanta, Dzogchen e Mahamudra, para começar a caminhada).

Uma característica definidora da consciência desperta é sua não dualidade. A consciência não dual é a experiência de estar consciente tanto fora quanto dentro do corpo simultaneamente.

Não é um ou/ou, mas ambos. Normalmente estamos focados em algo no mundo externo ou em pensamentos autorreferenciais.

As pesquisas demonstraram que a consciência não dual permite um estado mental atípico em que as experiências extrínsecas e intrínsecas são cada vez mais sinérgicas em vez de concorrentes.

Experimentamos um equilíbrio e unidade entre o interior e o exterior, sem a necessidade de opiniões, julgamentos ou julgamentos orientados para o ego e autoprotetores ou o desejo de controlar."

Isso que Kelly comenta tem extrema similaridade com a ativação do estado de flow, ou fluidez (acesse os artigos anteriores sobre o estado de flow e os videos no meu canal do YouTube aqui).

Minhas pesquisas no #estadodeflow, me trouxeram a este caminho da #nãodualidade há alguns anos. Sobre minha experiência, comento em outra ocasião.

A ideia desta primeira parte era provocar a sua curiosidade.

Para deixar o 'gancho' que as séries em geral deixam no fim de suas temporadas, divido aqui a história da pesquisadora Katrijn van Oudheusden, autora do livro "Selfless Leadership", que numa tradução livre, fala sobre uma liderança sem ego, à partir do conhecimento e despertar para a 'não dualidade'.

Li o livro e contactei a Katrijn para traduzir alguns de seus posts e materiais que ela vem incansavelmente publicando sobre o tema aqui no LinkedIn.

Logo você vai ve-los aqui no blog ou nos meus canais do LinkedIn e Instagram.

Mas para fechar essa primeira parte, deixo vocês com a história dela e como foi que ela começou essa jornada. No post, publicado esta semana, ela nos provoca a refletir sobre nossa auto-ilusão, o engano que cometemos desde que nascemos, o de achar que estamos separados do todo.

Como alguém já disse, nascemos com um corpo que funciona como um traje espacial. Aprendemos tão bem a lidar com ele, que o confundimos com nós mesmos...



O gráfico acima, aponta para os seis maiores auto-enganos que cometemos:

  1. A ilusão de que somos nosso corpo e estamos dentro dele

  2. A ilusão de que somos autores de nossas ações e vivemos nossa vida, quando na verdade somos vividos por ela (mais sobre isso na próxima edição do Psiconauta).

  3. A ilusão de que 'eu sou' por que meus pensamentos, percepções e emoções afirmam isso

  4. A ilusão de que eu 'estou' aqui e o mundo 'está' lá

  5. A ilusão de que eu sou o 'sujeito' das ações e a vida e as coisas acontecem comigo

  6. A ilusão de que eu sou o personagem, diretor e editor da história da minha vida.


Post da Katrijn:

Quer entender a auto-ilusão?

Então pare de acreditar em QUALQUER versão da sua história. No verão de 2011, percebi visceralmente que a história de Katrijn (eu) era uma ficção completa. Não importa se era uma história boa ou ruim (e variava!) Portanto, não havia mais crença na ficção. Tratava-se da ilusão de continuidade: a crença de que somos nossa narrativa. É a crença de que SOMOS a história pessoal que inventamos. Inventamos?? Mas todas essas coisas não aconteceram de fato comigo? Talvez. Podemos discutir a ilusão do espaço-tempo em outra ocasião. 😂 Mas sua interpretação do que sua história diz sobre sua identidade é tão fictícia quanto a identidade de Harry Potter. Seu cérebro não apenas registra memórias e as repete como uma câmera. É uma incrível máquina ininterrupta de criar significados, exagerar a realidade e contar histórias. Sua mente vai criar uma história sobre um eu pessoal e reescreverá continuamente essa história para atender aos requisitos atuais. Esses requisitos são principalmente sobre se moldar aos ambientes e manter um senso estável de si mesmo. Porque em termos de evolução, era encaixar no grupo ou morrer. Agora temos mais opções sobre qual grupo é esse. Pode até ser o grupo de não pertencer a um grupo.Mas sempre vamos inventar uma história, o cérebro não pode parar.

Imagine que você nasceu em um 1) família diferente, 2) cultura diferente, ou 3) período de tempo diferente. Você não seria você! Você seria outra pessoa! Se seu cérebro contasse uma narrativa diferente, 'este' você agora, não existiria.

Deixe essa informação no ar por um momento.

A sua história é uma construção total. Incluindo ESTA história, a que está acontecendo neste exato momento. Em combinação com mais 5 ilusões, cria a alucinação convincente de ser um eu separado. Katrijn van Oudheusden Ah, uma última observação: Falando sobre meditação, fica a pergunta para você responder nos comentários ou inbox: Qual o sentido de se meditar? Porque meditar? Qual o resultado que você busca ao fazer isso? -------------------------------------------------------------------------------------- Até a próxima edição, com a segunda parte deste instigante tema e com práticas para você levar para a vida. Que o Flow esteja com o você - aliás, ele está e é você ;) Um grande abraço! Cadu Lemos Sobre a newsletter "Psiconauta" é uma palavra baseada em raízes gregas que se traduzem em “explorador da mente”. É uma mistura de "psico'', um prefixo usado para descrever processos mentais ou práticas como psicologia e termos como argonauta e astronauta, cujas “viagens e explorações dos mares e do espaço” evocam uma transcendência elevada ou espiritual. A ideia é mensalmente provocar, refletir e agir sobre temas da mente e espírito. Siga nossos canais Instagram / YouTube / Website




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1 Comment


Paulo Manzano
Paulo Manzano
Apr 14, 2023

Qual o sentido de se meditar? Porque meditar? Qual o resultado que você busca ao fazer isso?


Como não medito da forma "tradicional" vou trancender essa pergunta para o pensar.


Pensar, refletir, observar, dialogar com nossa consciência, tudo isso me ajuda a dissolver questões do nosso quotidiano. A fugir do senso comum, dos vieses sócio culturais a que somos expostos e praticamente obrigados a concordar. O "sistema" é uma acomodação mais simples e rasa da nosaa existência. O pensamento ou meditação, eu acredito, nos elevam. Ou nos tiram as sensações oriundas da simplificação existencial que nos é apresentada.

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