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Foto do escritorCadu Lemos

#14/Uma perspectiva Não Dual sobre nossa real natureza, o estado de flow e os pensamentos




Dentro do meu propósito de tornar a não dualidade mais acessível e de compreensão mais ampla e objetiva, fugindo dos estereótipos espirituais, hoje quero falar sobre a recorrência dos pensamentos como algo que mascara nossa real natureza ao se sobrepor ao silêncio inerente da consciência desperta.


A jornada humana é, em sua essência, uma busca contínua por significado e conexão em meio a um vasto oceano de experiências. Esta busca é impulsionada por uma mente complexa e maravilhosa, uma ferramenta sem paralelo que nos capacita a construir civilizações, a criar arte e a compreender os mistérios do universo. 


No centro desta mente encontra-se o córtex pré-frontal (CpF), a nossa fábrica de pensamentos, que trabalha sem descanso na tentativa de dar sentido ao mundo ao nosso redor. No entanto, esta mesma ferramenta que nos permite navegar pela vida também também é o algoz de uma de nossas prisões mais restritivas, criando barreiras mentais que nos separam da experiência direta da realidade.


O córtex pré-frontal, com seu incansável processamento de informações, é responsável por nossa capacidade de planejar para o futuro, de abstrair e de analisar, racionalizar, intelectualizar, julgar (uma de nossas piores características - julgamos aos outros e a nós mesmos o tempo inteiro), habilidades que nos diferenciam de outras espécies. 

Ele nos permite mergulhar em complexos problemas matemáticos, compor sinfonias que tocam a alma e construir artefatos e tecnologias quase divinas (como já diria o biólogo Edward Wilson). 




No entanto, é também esse mesmo córtex pré-frontal que nos leva a nos perder em um labirinto de pensamentos recorrentes e ansiedades que nos isolam do momento presente – a única realidade que verdadeiramente possuímos.


Estes pensamentos, muitas vezes, se tornam uma recorrência infindável, uma narrativa contínua que nos convence de nossa separação do restante do universo. A mente humana é mestra na criação de histórias coerentes a partir de fragmentos de memórias, experiências e percepções. 


Essas histórias, que contamos a nós mesmos o tempo inteiro, constroem a sensação de um "eu" contínuo, uma identidade estável que transcende o tempo e o espaço. No entanto, esta sensação de continuidade é uma ilusão, uma das muitas cortinas de fumaça que nossa mente ergue para manter a ilusão da separação.


Em artigo anterior (veja aqui), comentei sobre a hipótese de que o estado de flow é uma condição inerente e constante do ser humano, porém, os pensamentos intermitentes anulam essa possibilidade. O córtex pré frontal é um empecilho na ativação ou acesso ao estado de flow, já que este pressupõe foco e concentração total e pensamentos recorrentes nos distraem. 


Quando há foco total, ocorre então a hipofrontalidade temporária (hipo menos, frontalidade do CpF) quando essa área do cérebro começa a passar por um desligamento e áreas como memórias, emoções e “insights”, ganham mais preponderância (veja aqui).


O conceito da não dualidade nos oferece uma lente alternativa através da qual podemos observar o mundo. Ela nos desafia a considerar que não há uma separação intrínseca entre o observador e o observado, entre o sujeito e o objeto, entre o "eu" e o "outro". 


Ao dar um passo atrás e nos tornarmos meros observadores dos nossos pensamentos, percebemos que somos mais do que a soma das nossas narrativas mentais. Somos, na verdade, a consciência desperta, um espaço aberto, infinito, no qual esses pensamentos, assim como emoções e outros objetos,  aparecem e desaparecem.




A abordagem do inglês Douglas Harding, escritor e filósofo inglês falecido em 2007,  "Headless Way", veja aqui, oferece uma prática direta e descomplicada para vivenciar esta verdade. Harding nos encoraja a esquecer temporariamente nossas identidades pessoais e a experimentar a realidade sem o filtro do "eu". Este exercício de nos ver sem cabeça, embora pareça estranho à primeira vista, é uma poderosa ferramenta para reorientar nossa percepção. Quando olhamos a partir desta perspectiva, a distinção entre o "eu" e o mundo ao redor começa a se dissolver, e uma sensação de unidade com o todo pode começar a emergir.


O holandês ‘carioca’ Bernardo Kastrup, por sua vez, expande essa visão com a hipótese dos redemoinhos. Imagine a consciência como um vasto oceano, onde cada redemoinho representa uma consciência individual. Estes redemoinhos são distintos, mas não separados do oceano; eles são o oceano em movimento. Da mesma forma, a consciência individual é uma manifestação localizada da consciência universal. 




Nossas mentes são expressões individuais dessa consciência mais ampla, e nossa sensação de isolamento é apenas o resultado de uma identificação excessiva com o redemoinho local, esquecendo que somos, de fato, o oceano inteiro.


A hipótese de Kastrup oferece uma visão reconfortante e esclarecedora: a de que, embora possamos nos sentir separados e isolados, estamos sempre conectados ao todo maior. A aparente solidez de nossas identidades individuais é desafiada pela fluidez de nossas experiências e pela interdependência de nossas existências, revelando assim a ilusão da separação e a profunda interconexão que permeia a realidade.

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